Como a Língua Portuguesa é verdadeiro instrumento de trabalho dos advogados, a etimologia das palavras é o belíssimo ramo da ciência linguística que estuda a gênese e o processo de formação dos vocábulos que utilizamos em nosso idioma. E a palavra advogar origina-se do termo em latim, advocare, ou seja, é a junção dos termos latinos ad, (junto), aglutinado com o termo vocare, que significa chamar, apelar. Logo, advogar é a união dessas palavras de origem latina formando a noção de ‘chamar para junto de si’, quer seja uma defesa, uma sustentação, no intuito de falar pelo outro, falar por alguém, presumindo-se, obviamente, em defesa de seus interesses.
Portanto, advogar é ‘chamar para junto de si’ a defesa de outrem, tomar como seu uma demanda, assumir a resolução de determinado problema de terceiro. Assim, podemos partir do pressuposto de que o surgimento do ofício dos advogados serviu para se manifestar na defesa dos interesses de outras pessoas.
E no rol de advogados ilustres e que defenderam os ideais mais elevados, ou que simplesmente se destacaram por sua capacidade intelectual, podemos citar indivíduos como Ruy Barbosa, Ulysses Guimarães, Getúlio Vargas, Evandro Lins e Silva, Clarice Lispector, Luís Gama, Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Abraham Lincoln, e muitos outros. Tais indivíduos se sobressaíram na profissão justamente por terem colocado interesses de outras pessoas, ou de grupos, e até mesmo da sociedade, como prioritários, assumindo tais tarefas como missão de vida, e desta forma garantiram seus respectivos nomes no seleto panteão daqueles que se destacam na história.
Por conseguinte, o advogado que conquista sua carteira da Ordem através da prova da OAB, automaticamente se filia a esse rol de indivíduos notáveis, assumindo implicitamente o compromisso social de honrar profissão tão nobre, calcada nos ideais humanos mais elevados. É de se espantar, portanto, o baixíssimo índice de aprovação nos últimos anos em subsequentes exames da prova da Ordem, em que o percentual de reprovação flutua em torno de 80 (oitenta) por cento.
Tal percentual tão baixo de aprovação é reflexo da ausência de uma visão estratégica do Ministério da Educação (MEC), que precisa urgentemente, em cooperação com a OAB, analisar os números de alunos aprovados nos exames de ordem, e verificar e fiscalizar a qualidade do ensino das universidades de Direito, incluindo as que já se utilizam de metodologia de Educação à distância, para, se for o caso, encerrar as atividades de tais unidades de ensino. Tal profusão descontrolada de faculdades de Direito provoca o fenômeno da mercantilização da advocacia, pois há muito mais profissionais advogados no país do que a demanda por esse tipo de serviço. Os números comparativos com outros países são elucidativos: há mais advogados no Brasil, do que o número somado de advogados no resto de todo o mundo.
Essa situação representa um quadro extremamente temerário para a sociedade brasileira, que fica a mercê de profissionais com baixa qualidade de formação para “chamarem para junto de si” a resolução dos problemas de seus clientes.
E o problema do Estado legiferante é outra luta que deve ser encampada pela OAB, na defesa da sociedade. De acordo com estimativas do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), desde a promulgação da Constituição de 1988, o Brasil editou o gritante número de mais de 05 (cinco) milhões de normas, incluindo os três níveis federativos: união, estados e municípios; dentre todas as espécies normativas, entre leis, medidas provisórias, instruções normativas, emendas constitucionais, decretos, portarias e atos declaratórios, contribuindo demasiadamente para a insegurança jurídica do ambiente de negócios no país. Assim, considerando o oceano desse emaranhado legislativo com tantas normas, o profissional que conheça ao menos os princípios e valores que o ordenamento jurídico aponta, se coloca no mercado de trabalho em um patamar diferenciado, capaz de indicar os melhores caminhos e soluções para que indivíduos e empresas estejam em conformidade legal, sendo que tal função é de importância precípua para a atividade de qualquer cidadão, ou pessoa jurídica.
Apesar da magnitude da advocacia para o povo brasileiro, a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) de 1988 reserva apenas um dispositivo constitucional em seu texto, dedicado exclusivamente aos advogados, presente no art. 133: “Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”.
Ocorre que é importante salientar que há não somente a importância da OAB para a sociedade, mas também existe a importância da OAB para os advogados, particularmente os advogados autônomos, especialmente aqueles que não estão vinculados a grandes escritórios, ou empresas. Para estes, a função da OAB é essencial para o exercício de suas atividades profissionais, pois são hipossuficientes frente a todos os outros polos que tangenciam seu ofício, quer seja o Poder Judiciário, seus ex adverso, e até mesmo, não raro, seus clientes.
Por conseguinte, a indispensabilidade do advogado na administração da justiça implica também que ela será fiscalizada e controlada pelos operadores que nela atuam, sendo tais profissionais os advogados, por excelência. Tal observação constante das atividades exercidas pelo Poder Judiciário implica, por exemplo, o respeito aos prazos estabelecidos no art. 226 do NCPC, que estabelece prazos mínimos da prestação jurisdicional. Tal art. 226 se coaduna perfeitamente com o estabelecido no art. 5º, inciso LXXVIII, introduzido com a EC 45/2004, e que consagra o corolário importantíssimo da “razoável duração do processo”.
Inclusive, é de se espantar a omissão da OAB na alteração da Lei 9.099/95, a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, pela Lei 13.728/18, que de forma manifestamente inconstitucional, vilipendiando o art. 5º, LXXVIII da CRFB, e violando a própria Lei 9.099, que consagra os princípios da simplicidade, oralidade, economia processual, e especialmente, a celeridade, ao estabelecer que seus prazos sejam contados apenas em dias úteis, em seu art. 12-A, introduzido por tal lei alteradora.
E na defesa dos direitos difusos e coletivos da sociedade, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil figura como uma das entidades legitimadas pelo artigo 103 constitucional admitidas a propor as ações constitucionais, ADPF, ADI e ADC.
Tanto é assim que a OAB protocolou a ADF 153, tentando questionar a abrangência da Lei da Anistia (6.683/79), para casos de tortura e crimes comuns, cometidos por civis e agentes do Estado durante a ditadura militar (1964-1985). Ocorre que apesar da relevância e pertinência de tal questionamento, o STF decidiu por maioria, em abril de 2010, que a Lei da Anistia vale sim, para todos. A partir daí é possível se fazer digressão sobre os impactos que uma Lei de Anistia ampla, geral e irrestrita causou nos rumos políticos do país, particularmente mantendo vivas as esperanças das “vivandeiras alvoroçadas”, que desde a redemocratização mantiveram-se ansiosas pelo retorno da ditadura militar no Brasil. Todos os demais países da América Latina optaram por não anistiar de forma tão acintosamente irrestrita os militares envolvidos em crimes hediondos e de guerra em suas respectivas ditaduras militares, contribuindo para a construção de um ambiente democrático subsequente muito mais saudável e consolidado. O Brasil foi o único país que fez a escolha da anistia geral e irrestrita.
E provavelmente a ação constitucional mais importante da história da República Federativa do Brasil foi a ADPF 130, ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), e que buscou derrubar a Lei de Imprensa sancionada no período da Ditadura Militar. Tal decisão garantiu a Liberdade de Imprensa e a plena Liberdade de Informação Jornalística no país, reestabelecendo o positivado na Ordem Constitucional que vigora a partir da promulgação da CRFB/88.
E ação constitucional que a OAB e a sociedade devem ficar atentos é a ADI 5613, ajuizada pela Associação Nacional de Jornais (ANJ), com a intenção de restringir a atividade de portais de notícias estrangeiros na internet brasileira. A OAB exercerá sua missão institucional se ingressar como Amicus Curiae nesta ADI a fim de defender os interesses do povo brasileiro no livre acesso à informação.
A importância da advocacia na vida das pessoas é inegável, sendo que uma fala do ex-presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamachia é muito elucidativa a esse respeito, quando afirmou que a advocacia defende honra, patrimônio, liberdade e a vida das pessoas, e naquilo que for aplicável, tais valores das empresas também.
A advocacia defende a honra e a liberdade dos indivíduos notadamente na advocacia criminal, e o patrimônio no âmbito do Direito Civil e Empresarial, permeados, é claro, pelas demais áreas do Direito que sejam pertinentes ao caso concreto.
Ocorre que historicamente, além da proteção da vida privada dos indivíduos, a OAB sempre foi defensora do Estado Democrático de Direito no Brasil, já tendo inclusive sofrido ataques dos órgãos de repressão da ditadura militar em sua sede, no Rio de Janeiro, em 27 de agosto de 1980, com a carta bomba que tirou a vida da funcionária Lida Monteiro da Silva. Essa é a relevância das comissões da OAB, quando, por exemplo, a Comissão da Verdade do Rio de Janeiro apresentou a conclusão das investigações desse atentado à sede da Ordem naquele fatídico dia 27 de agosto de 1980. Após dois anos de investigações, a comissão estadual concluiu que grupos de oficiais do Centro de Informação do Exército foram os responsáveis pelo atentado.
Há ainda outras comissões de extrema relevância social, como a Comissão Nacional da Verdade sobre a Escravidão Negra criada pelo CFOAB, de caráter simbólico importantíssimo, especialmente para uma sociedade que apenas ultimamente tem gradualmente se reconhecido como negra, mas que ainda não se enxerga racista. Pelo fato da maioria dos crimes cometidos no período da escravidão já terem prescrito, ao que consta, tal resgate histórico servirá muito mais para pautar a consolidação das próximas políticas públicas e de ações afirmativas, a fim de se construir uma igualdade racial plena no Brasil.
A pertinência estratégica de determinados segmentos da advocacia para os interesses da sociedade é flagrante nos ramos do Direito Ambiental, na advocacia tributária, no Direito do Consumidor, e particularmente, no desenvolvimento da Ciência e Tecnologia, o ramo da Propriedade Intelectual é de suma relevância para o Brasil se desenvolver economicamente de forma autóctone.
A advocacia tributária é importante para se garantir e permitir o exercício da livre iniciativa pelas empresas privadas, mediante a cobrança justa e equânime de tributos, afastando a possibilidade até mesmo de confisco, hipótese não tão distante da realidade brasileira em alguns casos.
Inclusive, há interseção entre o Direito Tributário e o Direito do Consumidor, eis que é premente no Brasil, em defesa da sociedade e dos consumidores, especialmente dos mais pobres, uma Reforma Tributária que promova justiça arrecadatória, tendo em vista que a maior parte dos tributos recaem sobre bens de consumo, já que não há mais no Brasil, após o governo Fernando Henrique Cardoso, a cobrança de tributos sobre os lucros e dividendos das empresas e conglomerados empresariais. Desta feita, onera-se demais em nosso país o trabalho, e o consumo, tributando-se de menos atividades que não produzem riqueza propriamente dita. E ao não se levar em conta a capacidade contributiva de cada setor de nossa sociedade, as faixas de cobrança do IRPF, por exemplo, estabelecidas de forma arbitrária, reproduzem tal injustiça tributária de forma inequívoca.
Já a Advocacia Ambiental, provavelmente é o ramo mais dramático de nossa profissão, por representar a fronteira mais importante da atuação profissional de um advogado no mundo atual. A destruição do meio-ambiente é destaque nos telejornais diuturnamente, e está intrinsecamente ligada com a capacidade de nossa sociedade saber se reinventar para sobrevivermos enquanto espécie ou não, sendo inquestionável para as parcelas esclarecidas da sociedade que os impactos das mudanças climáticas são inegáveis e perenes, e assim se manterá enquanto o nosso modelo de capitalismo consumista de bens de consumo não duráveis, e de matéria prima feitas de plástico advindo do petróleo, e que são descartados na Natureza de forma criminosa. Tais toneladas de plásticos se transformam em microplásticos, que entram em nossa corrente sanguínea através da água e dos alimentos que ingerimos, potencializado pelo fenômeno da magnificação trófica, pelo fato de nós, seres humanos, sermos predadores apex. Os microplásticos são apenas um dos problemas ambientais que enfrentamos enquanto sociedade.
E há também a interseção entre o Direito Ambiental, e o Direito da Propriedade Intelectual, que disciplina as marcas, patentes, Direitos Autorais etc., e lida com as novas tecnologias, patenteáveis ou não, mas que podem jogar luz para soluções tecnológicas mais benéficas para o meio-ambiente e para a sociedade. Inclusive, os setores da economia que lidam com geração de energia e a indústria de materiais podem ser apontados como duas das principais frentes de batalha da advocacia ambiental, e que deveriam ser seriamente regulados para serem forçados a adotarem tecnologias de geração de energias renováveis, e materiais biodegradáveis, eis que a tentativa de solucionar o problema da geração de lixo plástico jamais foi resolvida com reciclagem. Cada vez mais se reconhece o consenso de que o caminho para o lixo que se avoluma na Natureza e atinge a todas as espécies indistintamente, incluindo a espécie humana é a adoção de materiais biodegradáveis, e a geração de energia de fontes renováveis, implicando o abandono gradual do petróleo.
E apesar de a advocacia ser umas das profissões mais antigas e tradicionais da civilização ocidental, a atividade do advogado no século XXI está em vias de se transformar radicalmente em razão das novas tecnologias que vão surgindo com o desenvolvimento tecnológico. A promessa da inteligência artificial é de que a advocacia nunca mais será como outrora. Atividades como due diligence, por exemplo, sequer fazem sentido se forem feitas por seres humanos, quando já há no estado da técnica atual, máquinas que performam tais tarefas por uma fração do custo, e do tempo dispendido por um humano na realização da mesma tarefa. Tarefas repetitivas em geral tendem a ser abolidas das atividades humanas, sempre na perspectiva de que as máquinas são capazes de realiza-las por um custo muito menor, e de forma muito mais rápida e eficiente.
Não obstante, já há perspectivas de inteligências artificiais plenamente capazes de realizarem não somente as tarefas repetitivas, mas justamente as atividades que exigem um maior grau de sofisticação, e pensamento tipicamente humano, na fronteira com a capacidade cognitiva de uma pessoa comum. A reserva de mercado garantida por lei aos advogados no Brasil, que se habilitam ao ius postulandi mediante aprovação no exame da Ordem, não garante que tal capacidade postulatória não possa ser pleiteada por quem sabe, uma máquina. Enfim, por todo o exposto, a importância da OAB para a sociedade brasileira é múltipla e será cada vez mais relevante e importante num mundo que se torna constantemente mais complexo, e com desafios enormes para se buscar a redução das desigualdades, materiais e formais, entre os cidadãos brasileiros.